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Capítulo 1
Tarântule era uma cidade próspera, construída pelos anões. Ficava na base de uma imensa montanha, na parte externa era cercada por uma muralha alta, guardada dia e noite. Dentro da muralha havia várias casas, de estatura menor que as conhecidas pelos humanos. Mas o principal era a grande praça, onde foram construídas várias lojas em sua volta e o centro era repleto de pequenas barracas onde todos os tipos de comerciantes poderiam ser encontrados. Raros eram os humanos que viviam ali, poucos tinham permissão para fixar moradia e vender seus produtos, mas durante o dia na praça e as noites nas tavernas, o movimento deles era intenso. O comércio era muito forte ali.
Mas a verdadeira cidade, maior, grandiosa, era escondida dos olhares humanos, ficando dentro da montanha, salões imensos, esculpidos minunciosamente em cada detalhe nas rochas. O palácio do rei Artic era subterrâneo, porém mais majestoso que qualquer outro palácio daquelas terras naquela época. Centenas de túneis levando à verdadeiras mansões enterradas no coração da montanha, câmaras enormes, riquezas jamais vistas.
Os anões eram conhecidos por suas habilidades de minerar, lapidar e comerciar todo tipo de minério, incluindo ouro, prata e pedras preciosas. Possuíam grandes ferreiros, que não apenas forjavam armas e escudos, mas também todo tipo de utensílios. A maioria dos palácios e castelos daquelas terras negociava com eles. Eram finos cálices de ouro, pratos e travessas de prata, novas coroas cravejadas de pedras preciosas, joias usadas pelas mulheres de alto poder aquisitivo, até mesmo simples panelas de ferro, suportes e outros objetos necessários podiam ser negociados em Tarântule.
A riqueza daquela cidade era bem conhecida, atraia inveja de muitos povos, mas os anões eram fortes e bem armados, com a defesa da montanha, era praticamente impossível alguém tomar a cidade deles.
Garpim e Farfim eram dois anões jovens, recém casados, vivendo em uma casa bem no sopé da montanha. Farfim era uma mulher forte, como a maioria das anãs, tinha uma oficina em casa e montava joias com pedras preciosas que vendia em uma barraca no centro de Tarântule. Garpim tinha acabado de conseguir entrar na guarda da cidade, sendo designado para vigiar os portões da cidade externa. Não demorou muito para Farfim engravidar e logo deu à luz a Garfim. Pouco depois de Garfim chegar ao mundo, sua mãe, Farfim, engravidou novamente, por isso, precisou de mais repouso e trabalhava menos. Garpim se viu obrigado a trabalhar mais turnos, para compensar a queda financeira, então logo se destacou aos olhos dos comandantes.
Em poucos anos, Garpim se tornou encarregado dos portões internos da cidade, o que dividia a cidade externa da interna. Sua família cresceu bastante, Garfim já tinha quatro irmãos e sua mãe não podia mais trabalhar. Ele sempre acompanhava a mãe onde estivesse, seja fabricando joias, seja vendendo na praça. Uma vez um mago estava procurando algumas pedras maiores para armazenar energia específica, à qual poderia usar em outra ocasião. Garfim ficou fascinado com a magia dele. O mago brincou com o anãozinho enquanto conversava com Farfim, e mostrou algumas magias para o garoto. Desde então, Garfim se apaixonou pela magia.
Para um anão, é muito mais difícil manipular energia. Sempre que encontrava um mago, Garfim pedia conselhos e aulas. A maioria dos viajantes achava graça no garoto anão tentando usar magia, mas explicavam como proceder. Um viajante em especial, chamado Melki, sempre que vinha à cidade, procurava por Farfim, que lhe conseguia algumas pedras de bom tamanho, e se afeiçoou à Garfim, então passava vários ensinamentos para o menino. Cada vez que Melki voltava encontrava Garfim mais forte e com a magia melhor, apesar de o garoto não ter uma facilidade com a coisa, ele sempre se esforçava, cada vez mais, para atingir seu objetivo.
Garpim, agora encarregado dos portões internos, começou a fazer contato com pessoas mais influentes. Como era muito apegado com o filho, Garfim, conseguiu um arranjo para enviá-lo à Sheridom, onde aprenderia magia diretamente no castelo.
- Por mais que seja bonito nosso filho ter um sonho, ele é um anão, deve aprender o ofício dos pais, e a lutar como um anão, não ficar brincando com magia por aí. – Disse Farfim quando seu marido contou sobre o arranjo.
- Vou apoiar nosso filho, no que ele escolher e, se não der certo, vou recebê-lo de volta e aí sim ensinamos outras coisas pra ele. – Respondeu o anão.
Com a notícia, Garfim ficou extasiado, não acreditava que o pai deixaria algo assim acontecer e sabia que, naquela época, o castelo raramente aceitava um estudante novato em magia, apenas magos experientes podiam estudar ali. Mas ainda levou outro mês inteiro para partir, até que tudo estivesse preparado.
Garfim não tinha muita noção de tempo, só sabia que demorou muito para chegar ao castelo. Foi recebido, depois de mostrar uma carta ao guarda do portão, diretamente por Gaius, que o levou à uma sala afastada, mobiliada apenas com alguns sofás, para conversarem. Os outros dois anões que levaram o garoto, também foram convidados para a conversa.
- Eu quis que vocês estivessem presentes – Disse Gaius olhando para os dois anões que acompanharam Garfim. – para eu lhes dar uma triste notícia.
Os dois anões se entreolharam preocupados. Não lhes agradava estar em um castelo onde reinava a magia, um mago estranho à eles com palavras agourentas era tudo o que não queriam naquele momento, mas nada disseram.
- Pouco depois que vocês saíram de Tarântule, dois ou três dias depois, a cidade foi atacada. – Falou Gaius diante dos olhares estarrecidos dos anões.
- Mas como? Quem? – Perguntou um dos anões, que se chamava Pitt.
- As notícias chegaram aos poucos, mas parece que Orcs, Trolls e inúmeras outras bestas invadiram a cidade durante a noite, pegando todos desprevenidos.
- Mas e os nossos guerreiros? Devem ter expulsado os invasores. – Argumentou o anão.
- Os anões, depois de terem sofrido inúmeras baixas, começaram a levar vantagem sobre os monstros, mulheres e crianças também lutaram para proteger seus lares, mas então um dragão apareceu.
- Um dragão? Mas faz anos que foram extintos.
- Não. Ainda restam alguns, mas raramente deixam seus ninhos. São os mais sábios da espécie, já que sobreviveram ao extermínio.
- E o dragão se juntou aos monstros? – Dessa vez foi Garfim que falou com a voz embargada.
- Não exatamente. – Respondeu Gaius. – O dragão aproveitou que ambos os lados estavam extremamente enfraquecidos e matou todos os que achou pela frente. Queimou tudo o que podia pegar fogo, inclusive dentro da montanha. Selou as entradas da montanha derrubando as pedras dos portais. Depois entrou no salão onde eram guardadas as riquezas de Artic e fez sua morada ali. A cidade ficou em ruinas.
- E as pessoas?
- Sinto muito, as notícias dizem que não houve sobreviventes, apesar de eu achar que algumas pessoas possam ter escapado.
- E qual o nome desse dragão? – Perguntou Garfim.
- Arkong. – Respondeu Gaius.
- Vou mata-lo. – Disse o jovem anão.
Ninguém riu de Garfim, mas também ninguém encorajou o garoto. O silêncio tomou conta da sala. Sempre reservados, os dois anões se despediram de Gaius e Garfim, dizendo que ficariam por perto, mas que ainda decidiriam o que fazer. Ao ser deixado sozinho, o pequeno anão se sentiu abandonado, apesar de não ter nenhum vínculo com os outros dois anões, eles eram tudo o que lhe restou. Após os anões saírem, Gaius continuou a conversa apenas com Garfim.
- Entendo que você veio para esta escola estudar magia.
Pego de surpresa pela súbita mudança de assunto, Garfim saiu do seu estupor engasgando as palavras.
- Isso... Sim. Eu... queria ser um mago.
- Você sabe que anões raramente tem aptidão para a magia.
- Eu sei. Mas vou conseguir. – Disse Garfim de cabeça baixa.
- Então não deixe que ninguém lhe diga o contrário.
Garfim olhou assustado para Gaius, que o encarava atentamente.
- As pessoas vão tentar te humilhar, vão dizer que você não é capaz. Se você concordar em continuar o treinamento a qualquer custo, eu aceito você aqui.
- Sim. – Respondeu Garfim timidamente.
- Então além da magia, vou lhe ensinar os costumes do seu povo, e vai aprender também a manejar um machado. Uma vez que você perdeu sua terra natal, vou tomar conta de você.
Pelos próximos dezesseis anos, Garfim aprendeu o básico da magia. Mesmo com trabalho duro, não conseguia desenvolver sua magia. Estudou o máximo possível, aprendeu centenas de magias, uma vez que seu teste de aptidão não mostrou nada, conseguiu algumas joias, mas nunca revelou para ninguém, além de Gaius, a existência delas. Se dava melhor com a magia de água, mas podia usar qualquer elemento, ainda que limitado.
Por outro lado, se mostrou brilhante no uso do machado. Nascera para isso. Tinha equilíbrio e força natos, aprendeu técnicas de luta com facilidade.
Tinha pouquíssimos amigos. A maioria gostava é de tirar sarro dele por sua inaptidão com a magia. Mas isso não desanimou o jovem, que prometeu para Gaius sempre dar o melhor de si em treinamento.
No final de uma tarde, Gaius o chamou em seus aposentos, deu uma carta e uma adaga para Garfim e pediu-lhe que deixasse à vista para um certo grupo de jovens em uma certa taverna na cidade...
Capítulo 2
Uma semana depois de passarem pelos portões de Sheridon, Aaron, Lester e Garfim já tinham se tornado amigos. O anão era muito mais divertido do que aparentava, sempre fazendo brincadeiras ou falando bobagens.
Garfim era muito mais forte que um humano normal, mais forte até que Raika, e sabia manusear aquele machado como ninguém. A magia de Christofer era fraca, mas ele conseguia formar as figuras que desejasse com o fogo e causava algum dano com ela, ao contrário do anão, que formava figuras estranhas e sem força. Uma vez tentou invocar uma serpente de água, mas o que surgiu foi uma minhoquinha que quase não se sustentou no ar. Aaron e Lester riram como há muito tempo não faziam. Garfim começou a praguejar e destruiu uma pequena árvore que estava em seu caminho para poder se acalmar.
- Desculpe por isso. – Diz Garfim. – Ainda estou tentando controlar minha raiva.
- Não se preocupe, desde que não vire esse machado para nosso lado. – Diz Lester ainda rindo.
- Não! – Exclamou o anão. Foram tão poucos os amigos que ele fizera, que a ideia de ir contra esses novos companheiros lhe era horripilante. – Meu machado só conhece o caminho para os inimigos.
Mais risadas. A expressão de horror no rosto de Garfim era tão intensa que se tornou cômica aos olhos dos jovens. Dessa vez até o anão riu junto com eles.
Durante o dia, Garfim e Lester treinavam magia, o anão tinha um grande conhecimento teórico, afinal ele havia se dedicado intensamente à magia por anos a fio.
- Quando estiver tocando, deixe a energia sair pelos seus dedos junto com a música, dependendo da melodia e da sua intenção, você pode fazer quem escutar suas notas, relaxar, pode dar ânimo, pode deixar enfurecido, ou qualquer outro sentimento que você queira infundir. Se você se concentrar e liberar a quantidade de energia certa, pode até machucar seus oponentes. – Dizia o anão.
- Como assim machucar meus oponentes? – Perguntou Lester. – Vão ouvir minha música até seus ouvidos estourarem?
- Não. Já li que se liberar energia suficiente, um acorde apenas pode carregar uma onde de energia que destrói tudo em seu caminho. Funciona como uma flecha.
- Sério? – Se empolgou Lester. – Como eu faço isso?
Então o anão discutia os pormenores da teoria com Lester, que por mais que tentasse, não conseguia mover nem uma folha com suas notas. Por outro lado, conseguia mudar um pouco o humor do grupo dependendo da música que escolhesse. Tirava o mau humor com canções alegres ou motivava o grupo a continuar a caminhar depois de um dia particularmente cansativo. Lester se sentia bastante motivado em aprender, uma vez que vislumbrou a possibilidade de ser útil ao grupo, não apenas durante as horas de ócio, mas se houvesse um combate real.
Por outro lado, Aaron se sentia cada vez menos motivado. Começou a treinar com Garfim quase todos os finais de tarde. Apesar de o anão ser muito forte, seu repertório de ataques era pequeno. Logo Aaron se acostumou com os ataques e subjugou Garfim facilmente. O treino com espadas era muito mais variado, as possibilidades eram inúmeras, mantendo a mente afiada e sempre alerta para qualquer tipo de ataque que pudesse vir de seu oponente.
Com Garfim, o treino servia mais para desenvolver a força física, aparar os pesados golpes de machado, contra atacar com a mesma força, ainda era difícil para Aaron, mas um dia, Garfim disse:
- Antes de lutarmos hoje, libere um pouco de energia enquanto dia a palavra “Shiiaruu”.
- Shiiaruu. – Disse Aaron.
Nesse dia em diante, Aaron era capaz de segurar e repelir os ataques de Garfim com mais facilidade.
- O que quer dizer “Shiiaruu”? – Perguntou Aaron.
- Quer dizer “Força”. Creio que você libera a energia para seu próprio corpo, aumentando sua força física. – Respondeu o anão.
- Que legal!. – Respondeu Aaron. – Você sabe outras palavras? Para ficar rápido, invulnerável?
- A magia geralmente é usada com os elementos, então não conheço muitas palavras fora as que usamos para pequenos feitiços. Se eu fosse um mago mais forte, provavelmente teria aprendido palavras mais complicadas para outros tipos de magia. Mas conheço outra palavra. “Finel”. Que significa velocidade.
- Shiiaruu! Finel! – Gritou Aaron e partiu para cima de Garfim.
O anão quase não conseguiu aparar as duas primeiras investidas de Aaron, na terceira investida, o jovem Berserker jogou o amigo vários metros para trás.
- Me desculpe. – Gritou Aaron preocupado, correndo até onde Garfim estava caído.
- Não se preocupe. Precisa de muito mais que isso para me machucar. – Respondeu o anão. – Mas acho que você ainda precisa controlar esse poder.
- Sim. – Concordou o jovem. – Quase não percebi quando estava atacando.
- Mais importante que isso, você não deve confiar nesses poderes. Sua energia pode acabar a qualquer momento, daí você terá que contar com o próprio corpo para continuar.
Então Aaron não usou mais aqueles poderes recém descobertos, com medo de machucar Garfim. Mantinham um treino quase diário nos finais de tarde, sem uso de qualquer artifício.
As noites também não eram fáceis para Aaron, várias vezes ele sonhava com Raika, deitada em uma cela escura, com as paredes de madeira, mas não eram tábuas, parecia mais com o interior de uma árvore. A elfa acordava e o olhava diretamente nos olhos. Suas pupilas haviam sumido, restando apenas o branco no olhar. Às vezes ela apenas o encarava, outras vezes ela gritava em agonia e ainda outras vezes, ela pedia socorro. Aaron não conseguia ver, mas sabia que estava dentro de uma densa floresta. O cheiro era forte, mata molhada, húmida, folhas mortas ao chão. Mas havia também vários cheiros desconhecidos, como aroma de flores exóticas.
O jovem contou sobre seus sonhos uma noite, depois de terem feito a refeição noturna.
- Eu também sonho com Raika às vezes. – Disse Lester. – Creio que éramos muito próximos, por isso sentimos tanto sua falta.
- Mas os sonhos são tão vívidos, não parecem sonhos. Posso ver e sentir cada detalhe. – Respondeu Aaron.
- Muitos sonhos parecem reais. – Disse Garfim. – sua ânsia de ver novamente sua amiga deve mexer com sua mente.
- Mas e os cheiros? – Perguntou o jovem – Como posso sonhar com cheiros que nunca senti antes? Também a cela que ela está. Nunca vi nada parecido.
Essas palavras intrigaram seus amigos, que não tinham o que responder. Imaginar um cheiro novo era como imaginar uma cor nova. Impossível.
- Então pegaremos uma passagem pelas montanhas? Depois dessa cidade, Trastil? – Perguntou novamente Lester.
- É a última cidade antes das Cordilheiras Amaldiçoadas. – Respondeu Garfim.
- E o que tem depois dessas Cordilheiras? – Perguntou Aaron.
- Na verdade, não sei. – respondeu o anão. – os mapas que tive acesso, só mostravam até essas montanhas, com uma passagem logo depois de Trastil, daí para a frente é uma incógnita para mim também.
- E não podemos ir pelo outro lado? – Ingadou Aaron.
- Nos mapas, as montanhas vão até a borda do desenho, então não sei o que tem alí.
- Mas Gaius disse que você conhecia o caminho. – Disse Lester.
- Eu sei que o caminho é por alí, não existe outro jeito de atravessar as montanhas, mas podemos conseguir mais informações em Trastil.
- E então? – Perguntou Lester.
- Então vamos para Callámeda, salvamos Raika, depois vamos para Tarântule nós quatro e matamos o dragão. – Responde Aaron.
- Matamos o dragão? Fácil assim? – Diz Lester. – Como vamos fazer isso? Segundo Garfim, ele dizimou uma cidade cheia de Anões guerreiros.
- Não sei. – confessou Aaron. – Mas quando estivermos com Raika, pensaremos em um jeito. Talvez ela saiba de algo sobre como matar um dragão.
Por quase quatro semanas eles caminharam para o que deveria ser o nordeste, quando ouviram o som de diversos passos correndo em sua direção.
Capítulo 3
Era final de tarde quando ouviram o primeiro barulho. Parecia um cavalo galopando ao longe. Logo ouviram mais passos. Alguns pesados, outros leves. Ainda havia sons de cascos misturados.
- Acho que devemos sair da estrada. – Disse Garfim. Foi prontamente atendido pelos amigos.
Em pouco tempo, o grupo viu uma mulher montada em um cavalo passar correndo por eles, com um vestido branco esvoaçando atrás dela. Também viram quando uma flecha se encravou em suas costas, derrubando-a no chão há poucos metros de distância. O cavalo continuou em disparada, deixando a mulher caída no caminho. Aaron saiu de trás da árvore no mesmo instante, e correu até ela.
- Me... me ajude. – A mulher balbuciou. Mas quando Aaron pegou-a nos braços, sentiu sua vida esvaindo-se rapidamente. O jovem mais sentiu do que viu, soltou a mulher se jogando para trás, quando outra flecha passou raspando por ele e se enterrou em uma árvore próxima. Ao olhar para trás, viu apenas a silhueta de um cavaleiro puxando a corda de um arco exageradamente grande de cima de seu cavalo.
Aaron facilmente se desviou da próxima flecha enquanto viu o cavalheiro jogando o arco nas costas e retirando uma espada da lateral do cavalo.
O sol estava se pondo por trás do cavaleiro, então o jovem via apenas um vulto preto levantando a espada.
- Shiiaruu. – Sussurrou Aaron poucos momentos antes da enorme espada descer em sua direção.
Aaron levantou a espada para aparar o golpe, mas a força usada pelo cavaleiro era tão grande, que rachou a pedra sob os pés do jovem. Se não tivesse usado a magia, provavelmente estaria com sérios problemas agora. Mas por sorte, conseguiu se lembrar da palavra à tempo.
Pouco depois chegaram alguns orcs pela estrada. Garfim e Lester foram em sua direção para intercepta-los. O anão levantou a mão e gritou:
- Wolsh!
A água jorrou de seus cantis em direção aos monstros, que se assustaram por um momento com toda aquela água vindo do nada em sua direção. Não conseguiram desviar quando a água atingiu em cheio seus rostos.
Risadas.
Os orcs estavam molhados. E só. Começaram a rir quando perceberam que não receberam nenhum dano daquela água voadora, só pararam quando a cabeça do orc que estava mais adiantado tombou para o lado e notaram o anão com o rosto vermelho de raiva bramindo um machado ensanguentado. Com um novo ódio dando-lhes força, pegaram suas espadas enferrujadas e correram em direção ao anão. Ouviram uma música que os deixou confusos, lembraram-se de dias passados, difíceis, onde dor e da fome que os perseguiam. Com isso, um a um foram sendo mortos pelo machado de Garfim e pela espada de Lester.
Aaron tentava revidar, mas o cavaleiro era muito rápido. Cada golpe que aparava, era jogado alguns centímetros para trás. Não conseguia dar a volta no cavalo, pois este parecia em sintonia com seu dono, colocando-o sempre em melhor posição para atacar.
- Finel. – Por fim lembrou-se o jovem da palavra.
Aaron sentiu o mundo desacelerando. Com o calor da luta, conseguiu se concentrar no cavaleiro. Os golpes ainda vinham rapidamente, mas o jovem conseguiu desviar ao invés de aparar. Ao passar pelo lado do cavalo e se colocar atrás dele, levou um susto.
Cavalo e cavaleiro eram um só. O homem com a pele escura, nú até a cintura, onde a pele começava a engrossar e logo nasciam pelos, se transformando em um cavalo. O tronco e os braços dele eram fortíssimos, se aproveitou da confusão momentânea do jovem oponente e se lançou em mais um ataque.
Aaron aparou mais uma investida daquele oponente, mas notou que seus braços começaram a doer e ele estava se cansando rapidamente.
Antes de acabarem de matar todos os orcs, que representavam pouca resistência, chegaram outros monstros, que deveriam ter ficado para trás na perseguição à mulher de cavalo. Eram seres deformados, com membros amputados ou tortos. Alguns não conseguiam fechar a boca. Pareciam com orcs, mas com cabeças mais parecidas com humanos. Com alguns tufos de cabelos no lugar onde a maioria já tinha caído. Alguns com olhos bem distantes um dos outros, outros com o rosto desnivelado, como se tivesse derretido pela metade. Mas todos eles armados. Espadas, martelos, machados ou pedaços de pau com pregos neles.
Lester tentou tocar uma melodia triste, mas isso não afetou a nova onda de monstros que chegou, talvez fosse a vida vazia destes ou a falta de preparo do jovem bardo, mas o primeiro que chegou destruiu seu bandolim no primeiro ataque com um machado.
Garfim matou este monstro que atacou Lester, mas foi atingido por deixar de prestar atenção ao seu oponente. Os orcs já estavam se recuperando da confusão.
Aaron atacava seu oponente, mas mesmo sendo mais rápido que ele agora, não conseguia ferir gravemente seu oponente.
Mesmo estando tão forte quanto e ainda mais rápido que o monstro, o jovem sofreu vários cortes superficiais, fazendo com que cada movimento se tornasse difícil devido às pequenas dores de movimentar os membros com diversas lesões.
Ambos cansados quando, com uma finta, Aaron se desviou de um ataque lateral e cortou fora uma das patas dianteiras do oponente, que caiu no chão. O jovem aproveitou e cortou fora a cabeça dele.
Lester havia se recuperado rapidamente e pegado novamente sua espada. Os monstros mais fracos que chegaram eram descoordenados e morriam facilmente, mas os orcs que sobraram eram bem treinados, sendo adversários muito difíceis para ele.
Garfim já se saía melhor contra os orcs, conseguia mata-los com uma pequena troca de golpes, mas o número de monstros era alto, e muitas vezes dois ou três ataques simultâneos faziam com que fosse ferido.
Com o canto dos olhos, os dois viram ao mesmo tempo quando Aaron se lançou no meio da turba de monstros. Tiveram a impressão que ele estava dançando com a espada nas mãos. O brilho prateado da arma subia, descia, fazia círculos, enquanto fontes carmesins jorravam em seu caminho. Fossem os monstros deformados ou orcs mais experientes, todos tombavam quando chegavam perto do jovem Berserker.
Em pouco tempo, o número de monstros foi caindo, até não restar mais nenhum deles. Quando Aaron alcançou os últimos monstros que lutavam com Garfim e Lester, ele atacava sem distinção. Não matou os amigos pois estes se defenderam no último instante. A espada de Lester quebrou mas segurou a maior parte do golpe, jogando-o longe com parte de seu traje cortado junto com um talho no ombro. Já o machado de Garfim conseguiu segurar a espada de Aaron, e com um chute, jogou-o para trás.
- Aaron. – Gritou o anão.
Só então o jovem pareceu entender o que estava acontecendo. Olhou para o anão, com uma expressão de confusão no rosto. Ainda arfando, tombou desacordado.
Aaron acordou. A cabeça doía, a boca estava seca. Seu estômago reclamava de fome. Olhou em volta e viu Lester deitado ao seu lado, com o ombro enfaixado. Garfim estava mais à frente recostado em uma árvore, montando guarda. O ambiente estava escuro, com a exceção da fogueira que ardia em sua frente. Ao tentar se levantar descobriu que estava exausto. Uma tontura jogou-o de volta ao chão onde adormeceu novamente.
Ao acordar novamente, o sol já ia alto. Aaron ainda se sentia cansado, mas o equilíbrio voltara. Não viu Lester nem Garfim por perto, mas uma fogueira aquecia uma panela que exalava um cheiro delicioso.
- Finalmente acordou. – Ouviu-se a voz de Lester atrás do jovem. – Estávamos começando a ficar preocupados.
Aaron olhou para o amigo e empalideceu quando viu o ombro ainda com as faixas sujas de sangue. O jovem bardo percebendo a reação do amigo ao olhar para se ferimento disse:
- Não foi nada. Se você não tivesse nos ajudado, provavelmente estaríamos naquela pilha flamejante.
Foi então que Aaron percebeu que uma fumaça negra subia de algum lugar perto dali.
- O que é aquilo?
- Garfim juntou todos os corpos daqueles monstros e fez uma fogueira enorme com eles.
- Acho melhor darmos o fora daqui. Podem aparecer curiosos. – Disse o anão saindo de trás de uma árvore. Virando-se para Aaron, disse: – Você está bem? Pode andar?
- Acho que sim. Estou faminto.
- Vamos comer então, depois saímos daqui. – Disse Lester.